Efeito da Toxina Botulínica e CGRP na Enxaqueca

Visto que a enxaqueca é muito mais comum em mulheres, com prevalência de 2 a 3 vezes maior do que em homens, será que as novas medicações para tratamento preventivo da enxaqueca também podem agir de forma mais eficaz na mulher? Novos estudos mostram que pelo menos nos modelos animais em ratas isto acontece.

As causas da enxaqueca ainda não são completamente conhecidas, mas sabe-se que podem ter origem por mecanismos central e periféricos. O que isso quer dizer? Mecanismos de origem central significam que alterações em estruturas do sistema nervoso central, como o córtex, hipotálamo, tálamo, entre outras, estão alteradas modificando a excitabilidade cerebral, propciando as crises de dor de cabeça. Acredita-se que um mecanismo causador da enxaqueca seja a depressão alastrante cortical (DAC). A DAC uma onda de despolarização dos neurônios que se propaga no córtex occipital (região da nuca) e que também está relacionada à aura da enxaqueca. Já o mecanismo periférico envolve a ativação de nociceptores (neurônios que processam estímulos dolorosos) da meninge que envolve o cérebro e dos vasos cerebrais. No entanto, a DAC (com origem central) pode ativar o sistema trigeminovascular, onde se encontram neurônios que trazem informação dos nociceptores das meninges e vasos cerebrais.
Toxina Botulínica Tipo A
A toxina botulínica tipo A (Botox) vem se mostrando eficaz no tratamento da enxaqueca crônica. Estudos realizados com modelos pré-clínicos, ou seja, com animais de laboratório simulando mecanismos neurofisiológicos da doença, estão começando a revelar como essas medicações funcionam contra a enxaqueca.
Um grupo de pesquisadores do Hospital Beth Israel Deaconess Medical Center e Harvard Medical School, liderado pelo Dr. Rami Burstein, mostrou que a indução de DAC em ratos, simulando uma crise de enxaqueca, ativa o sistema trigeminovascular e aumenta o disparo de nociceptores das meninges. Mais recentemente, esses mesmo grupo de pesquisadores mostrou que em ratas fêmeas a aplicação de Botox aplicadas perifericamente nas suturas lambdoide e sagital reduziu os disparos de nociceptores induzidos pela DAC em 72%, indicando que a ativação de nociceptores por fenômenos centrais indutores de enxaqueca como a DAC podem ser bloqueados pelo Botox.
CGRP
O CGRP (do Inglês, calcitonin gene-related peptide) é um neuropeptídeo inflamatório e vasodilatador que esta elevado na circulação de pessoas com enxaqueca e induz enxaqueca nesses pacientes quando injetados via intravenosa.
Crescente número de estudos em modelos animais pré-clínicos tem mostrado que as fêmeas são mais suscetíveis aos efeitos causadores de dor (nociceptivos) pelo CGRP, possivelmente por efeitos amplificadores do estrogênio sobre receptores do CGRP.
Um estudo brasileiro, liderado pela Dra. Juliana Geremias Chichorro, da Universidade Federal do Paraná, mostrou em um outro modelo animal de enxaqueca que o CGRP aplicado dentro do gânglio trigeminal foi capaz de induzir respostas neurofisiológicas e comportamentais semelhantes à enxaqueca em ratos machos e fêmeas, como alodínia cutânea (quando a pele do escalpo fica dolorosa), intolerância à luz (fotofobia) e comportamento de ansiedade.
Interessante notar, ainda nesse estudo brasileiro, drogas com ações neuroprotetoras como minociclina e propentofilina foram eficazes para inibir os efeitos do CGRP apenas nos ratos machos. No entanto, sumatriptano, que atualmente é prescrito para abortar crise de enxaqueca, foi eficaz para inibir a ação do CGRP em ambos os sexos.
Uma nova classe de medicamentos preventivos, chamadas anticorpos monoclonais anti-CGRP (erenumab, fremanezumab, galcanezumab, eptinezumab), atuam neutralizando o receptor do CGRP nas células, impedindo sua ação ou retirando o próprio CGRP da circulação. Essa classe de medicação já está aprovada pela ANVISA no Brasil, mas com data de lançamento ainda indeterminada.
Link dos estudos: